Acusado de estupro, Rodrigo Carvalheira passa por primeira sessão de audiência de instrução
Foto: Marina Torres/DP
O empresário sentou no banco dos réus, nesta segunda (15), para acompanhar a primeira audiência de instrução e julgamento de um dos processos que responde por crimes sexuais contra mulheres. Ele está preso desde do dia 6 de junho, no Cotel, em Abreu e Lima, no Grande Recife
A primeira sessão da audiência de instrução e julgamento de um dos
três processos contra o empresário Rodrigo Carvalheira, réu por crimes
sexuais, foi realizada nesta segunda-feira (15), no Fórum Desembargador
Rodolfo Aureliano, na Ilha Joana Bezerra, área central do Recife.
De
acordo com o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE), foram
ouvidas a vítima e todas as testemunhas arroladas na denúncia, em
aproximadamente cinco horas. "Diante do adiantado da hora, a audiência
foi finalizada por volta das 14h30, sendo redesignada uma audiência
posterior para a oitiva das testemunhas arroladas na resposta à acusação
e para o interrogatório do acusado", informou a assessoria de imprensa
do tribunal, em nota.
A audiência é referente a um
processo por estupro em 2019. Estavam presentes na sessão o Ministério
Público, advogados habilitados como assistentes da acusação e advogados
da defesa.
Na
chegada ao fórum, ao ser questionado pela imprensa se tinha algo a
declarar sobre o caso, Carvalheira afirmou que “os humilhados serão
exaltados”.
O advogado Wilibrando
Albuquerque, que representa o empresário junto aos advogados Thiago
Guimarães e Dyego Lima, comentou a avaliação da defesa sobre a sessão em
entrevista ao Diario. Segundo ele, a nova audiência deve ser marcada
pelo judiciário para o final do mês de agosto.
“Todas
elas (testemunhas de acusação) diziam palavras do tipo ‘modus
operandi’, mas o cidadão médio não usa esse termo, mas todas as
testemunhas usavam essa palavra e não traziam outros elementos.
Disseram: ‘ele (Rodrigo) me dava o comprimido e eu apagava’. E
perguntavam quanto tempo passava? E elas diziam: 'Não lembro’ Outras
não se recordam do tempo que aconteceu. A gente questionava e a juíza
indeferia. São situações que já são delicadas por si. Não estou aqui
para descredibilizar nenhuma vítima, não desrespeito, mas é uma situação
estranha, porque não sabem contar: ‘como uma pessoa coloca um
comprimido goela abaixo?’. Como a pessoa não sabe precisar o horário que
estava em determinado local? Então, como essa pessoa sabe que foi
estuprada ou não? Então, assim, são situações nebulosas”, disse o
defensor.
“São circunstâncias que trazem uma
nebulosidade. Para a defesa, traz inquietação. Qualquer condenação está
calcada em provas concretas. É muito difícil, porque as vítimas se
uniram, fizeram um grupo e em cima da situação estão fazendo ativismo.
Eu continuo acreditando na inocência do meu cliente. Mas é um processo
que tem contornos bem delineados. Acredito que não vai se resolver no
Recife”, acrescentou.
Protesto
Do
lado de fora do fórum, aconteceu um protesto. A mãe de uma das
denunciantes, cujo caso prescreveu, afirmou que o propósito era clamar
por justiça.
“Milhares de mulheres são
estupradas das mais variadas formas, todos os dias em nosso país e a
impunidade continua presente. A gente precisa colocar o estuprador onde
deve ser, na cadeia”, disse.
“Minha
filha foi estuprada com 16 anos, hoje ela tem 34 anos. Ela ficou muito
traumatizada, quando ela fala do assunto, ela sangra”, completou.
Trajados
com camisas escrito “Amigo não abusa”, em alusão a um dos argumentos
apresentados pelo acusado, dois parentes de uma outra vítima também
participaram do ato.
Foto: Marina Torres/DP |
Para
eles, a mudança foi psicológica foi perceptível. “Ela foi abusada em
2019, na época a gente não sabia, mas percebemos que ela estava
diferente. Não saia tanto, ficava mais em casa. Estava cada vez mais
introspectiva”, relatou um dos parentes. “Até que em novembro do ano
passado, ela fez uma ligação de vídeo com a gente e foi quando ela
desabou e contou tudo que aconteceu. Foi só aí que a família ficou
ciente”, explicou outro.
Entidades feministas
“Segundo
eles, as vítimas desse estupro são ‘meninas de festinha’”, pontua Lara
Buitron, do Fórum de Mulheres de Pernambuco. “São meninas que estão aí
para serem usadas, esse é o sentido que o advogado coloca nas suas
frases. Para culpabilizar as vítimas eles estão colocando que elas são
usuárias de drogas, o que não tem nenhum problema, usar drogas não
significa que seu corpo está disponível para ser violentado. É
exatamente o mesmo argumento usado no caso de Ângela Diniz, morta em
1986”, relembra.
Advogada e líder do comitê de
combate a violência contra mulheres do Grupo Mulheres do Brasil Recife,
Barthira Caldas, comenta que a luta das mulheres é provar que têm
direitos e deveres, diariamente. “Então assim, é muito importante que a
gente traga essa pauta, que a gente apoie outras mulheres, que as
mulheres estejam juntas nesses movimentos. Temos que exterminar a
violência contra a mulher, porque a violência não é só a física. Quer
dizer que mulheres não podem de forma nenhuma sair, se divertir, não têm
o direito, como todos os homens fazem, a gente não pode ter esse
direito. Estamos regredindo?”, questiona.
Barthira
ainda pontua que a agressão contra a mulher não é uma agressão apenas à
vítima. “Quando se fala em agressão contra a mulher, se destrói uma
família. E, também, uma nova geração de meninas e adolescentes que estão
passando e vivenciando já desde nova essas violências. Nossa luta é
essa. Exterminar a violência contra a mulher”.
O caso
Rodrigo
Carvalheira foi preso pela segunda vez em junho e está no Centro de
Observação e Triagem Professor Everardo Luna (Cotel), em Abreu e Lima,
no Grande Recife. A primeira prisão aconteceu em abril, quando ele ficou
menos de uma semana no presídio.
A segunda
prisão foi pedida pelo Ministério Público (MPPE) devido a uma ligação
que Rodrigo Carvalheira teria feito em dezembro de 2023. Ele teria
mantido contato com o tio de uma suposta vítima.
Assim, o MPPE considerou que o empresário estaria interferindo nas investigações do caso.
Inquéritos
No dia 31 de maio, a Polícia Civil pernambucana detalhou o estágio dos cinco inquéritos que investigaram o empresário.
Em
três casos, ele foi indiciado por estupro de vulnerável. Os outros dois
prescreveram. Ou seja, o Estado não tem mais como executar a punição
contra o empresário.
Em todos, no entanto, a
Polícia Civil encontrou um ponto em comum: Carvalheira aproveitou
relações de amizade para poder estuprar as vítimas.
Além disso, em todos os episódios, segundo a polícia, as vítimas estavam sob efeito de álcool ou em estado de sonolência.
A corporação também afirmou que duas das cinco mulheres eram adolescentes na época em que os estupros aconteceram.
Uma delas sofreu a violência sexual no dia do próprio aniversário de 16 anos, em 2009.
A outra também tinha 16 anos na época em que foi estuprada, em 2005. Esses dois são justamente os casos que prescreveram.
Dessas
duas vítimas, uma delas foi estuprada quando estava em estado de
embriaguez e outra quando estava sob o efeito parcial de embriaguez,
segundo a polícia.
“A conduta do investigado
revelou o mesmo método de ação. Foram feitas várias diligências, algumas
sigilosas. A gente constatou que existiam elementos suficientes para
fazer o indiciamento. A gente identificava o estado de vulnerabilidade
das vítimas e o elo de confiança que o investigado tinha com elas. O que
torna elas mais vulneráveis ainda, pela relação de confiança e retirada
de vigilância. Eram relação de amizade prévia. Outras mulheres que
também eram consideradas amigas do investigado perceberam que passaram
pela mesma coisa. Essas vítimas levavam um bom tempo para perceber que
tinham sido vítimas de um crime”, disse a delegada Jéssica Ramos,
titular da 1ª Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM).
“Esses
fatos são bem diferentes dos casos de estupro que estamos acostumados a
ver. Aqui, a gente trata de uma relação de grupo de amigos, em que a
vítima não espera ser abordada de alguma maneira indesejada que está ali
convivendo com você. Aquele pessoal que faz parte do grupo de amigos se
surpreende com atitudes de violência sexual. Ficaram evidenciadas
tentativas de relações sexuais, quando as vítimas estavam em estado de
sonolência ou embriagadas, pelo uso de álcool. Então, esse estado em
que a pessoa se encontra em sonolência ou embriaguez acaba a tornando
vulnerável. Ela não consegue optar, de fato, e saber o que quer ou não
quer deixar acontecer. Algumas vítimas nem se lembram como deixam
acontecer as situações. Então, o ponto-chave é que havia sempre essa
relação de amizade e confiança. Algumas vítimas tiveram somente a
coragem de denunciar anos depois, o que não significa que o crime não
deixou de acontecer”, completou.
Por: Wilson Maranhão
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