Coração do comércio popular do Recife, Camelódromo faz 30 anos à espera de dias melhores
O Camelódromo da Dantas Barreto completou 30 anos no último mês de fevereiro (Foto: Priscilla Melo/DP )
Calçadão dos Mascates, na Avenida Dantas Barreto, enfrenta problemas. Comerciantes e cliente pedem providências e prefeitura diz que está fazendo "grande intervenção".
Não existe nenhuma cidade grande sem comércio popular. E não há nenhum ponto de vendas que sobreviva sem ter gente para frequentar e comprar.
Cidade conhecida, desde as origens, pelos vendedores nas ruas, os mascates, o Recife tem no coração do Centro da cidade um exemplo de de central de vendas erguida pensando em grande parte da população.
Movimentado e “concorrido”, o Calçadão dos Mascates, mais conhecido como o Camelódromo da Avenida Dantas Barreto, completou, em fevereiro este ano, 30 anos.
Mesmo com todos os problemas, ele resistiu ao tempo.
Passadas três décadas desde a fundação, na gestão do ex-prefeito Jarbas Vasconcelos, o "Camelódromo" passou pelo "aniversário" de forma silenciosa.
Uma das provas de que, mesmo com a importante data, não há muito o que se comemorar na área do projeto de autoria dos arquitetos pernambucanos Ronaldo L’Amour e Zeca Brandão.
Nem para quem vende nos boxes criados pelo projeto original nem para os barraqueiros e ambulantes que frequentam a área e, sobretudo, para os clientes que sofrem com a infraestrutura precária.
Muitos problemas
Quem circula pelo "Calçadão dos Mascates" se depara com um uma séria de problemas.
Do projeto original, ainda estão lá as estruturas de concreto dos seis módulos e mil boxes.
Mas a ideia de retirar os ambulantes das ruas e garantir locais apropriados para o comércio, com tranquilidade e higiene para trabalhadores e clientes, foi se perdendo, aos poucos.
Tem de tudo na área do camelódro, que começa nas imediações do pátio de São Pedro e segue até a Praça Sérgio Loreto, no bairro de São José.
Quem anda por lá encara todos os dias entulhos, mau cheiro e a falta de ordenamento.
Muito lixo e entulhos são encontrados diariamente dentro e nos arredores do Camelódromo da Dantas Barreto (Foto: Priscilla Melo/DP ) |
As mercadorias da minilojas tomam conta das calçadas e também das vias. Isso atrapalha a circulação de veículos e de pedestres.
Nas estruturas onde funcionam os boxes, consumidores e comerciantes disputam epaço com bicicletas e até motos, que circulam sem nenhuma proibição.
Atualmente, só três etapas do complexo estão ocupadas.
O maior problema, no entanto, é o sexto e último módulo.
Ele fica nas imediações da Praça Sérgio Loreto, perto da sede do
Galo da Madrugada.
Em 2019, esse setor foi alvo de uma ação da Secretaria de Mobilidade e Controle Urbano (Semoc), sendo transformado em uma mini-rodoviária para coletivos intermunicipais.
O sexto módulo do Camelódromo se transformou em uma mini rodoviária de ônibus (Foto: Priscilla Melo/DP ) |
São ônibus de linhas que ligam o Recife a cidades da Região Metropolitana, além de outros municípios na Mata Norte e Agreste do Estado.
Tristeza
Para quem frequenta diariamente o camelódromo, os sentimento são de tristeza e desânimo de constatar que o espaço está se degradando cada vez mais.
É o caso de uma das mais antigas comerciantes do equipamento, Betânia Moreira, de 60 anos.
Ela se dedica para vender roupas há mais de 25 anos no camelódromo.
Betãnia reclama da degradação estrutural do espaço e cobra da Prefeitura do Recife (PCR) a criação de um canal de escuta pública entre a gestão municipal e os comerciantes para tratar sobre pautas de melhorias do camelódromo.
“O camelódromo, infelizmente, está se degradando, ano após ano. Trabalhamos aqui na condição precária e, por muitas vezes, temos que investir do próprio bolso para fazer alguma melhoria estrutural nos boxes. Seria necessária aqui uma revitalização para que nós comerciantes pudéssemos ter a dignidade de vender seu nos preocuparmos com o calor, com a sujeira acumulada e falta de segurança. Estou aqui desde 1999 e é difícil o poder público escutar a gente. Do passado pra cá, muita coisa mudou, mas para pior”, reclamou a comerciante que atua no módulo 1 do camelódromo.
A comerciante Betânia Moreira detalhou quais medidas poderiam melhorar a estrutura do camelódromo (Foto: Priscilla Melo/DP) |
Mais à frente, no módulo 3, a também comerciante Emily de Souza, de 28 anos, trabalha há 10 anos na venda de artigos religiosos no local.
Segundo ela, uma das principais queixas dos trabalhadores informais é a falta de refrigeração e a sujeira no equipamento.
“Sim, aqui sofremos muito com o calor. Não há nem um ventinho como alternativa. Ultimamente, os dias estão bem quentes e temos que investir do nosso bolso a instalação de ventilador no box. Mas não é suficiente. Acredito que poderia sim ter um projeto ou estudo para implantar aqui um sistema de refrigeração. Aqui também temos o problema de muita sujeira acumulada, com lixo e entulhos espalhados por alguns pontos. Aqui mesmo, tenho que passar sempre o pano e varrer para não deixar lixo acumular no boxe. Isso acaba afastando os clientes. Pois, pensar na melhoria da estrutura do camelódromo é pensar no melhor local de comércio para todos”, disse a comerciante.
Em vários pontos nos arredores do camelódromo é possível presenciar lixo acumulado nas calçadas (Foto: Priscilla Melo/DP ) |
Emily estava atendendo a doméstica Maria de Fátima, de 45 anos, que mora próximo ao camelódromo, no bairro de São José.
Ela também se queixou do calor, da sujeira e da falta de organização dos boxes.
A comerciante Emily e a consumidora Maria de Fátima citam as melhorias que o Camelódromo da Dantas Barreto poderia receber (Foto: Priscilla Melo/DP ) |
“Sempre que eu venho aqui é muito calor e muita sujeira pelos corredores. O camelódromo é um espaço tão antigo e importante para o comércio que causa hoje em dia uma sensação desagradável. É ruim para a gente que vem consumir, imagina para quem trabalha? Fora isso, os boxes são desordenados, um colado com o outro, e às vezes não há nem espaço adequado pra todo mundo. Seria necessário aqui uma revitalização grande para poder transformar o camelódromo em um espaço digno pra todos”, comentou a consumidora.
O que diz a prefeitura
O administração municipal optou por enviar uma nota e disse que "está em curso a maior intervenção de requalificação estrutural da história do Calçadão dos Mascates".
Ainda de acordo com a prefeitura, além de toda a recuperação da estrutura de ferro, estão sendo atualizadas as instalações elétricas e hidráulicas, além da drenagem. Com a reforma, todos os equipamentos de medição de energia elétrica serão individualizados.
"A intervenção no Camelódromo deverá ser entregue até o final do ano", acrescentou.
A história do ontem para o hoje
Significantes transformações urbanísticas e de mobilidade na Avenida Dantas Barreto, no bairro de São José, tiveram início há mais de cinco décadas.
Foi na Dantas Barreto que aconteceu uma das mais significativas alterações urbanas do Centro do Recife, ocorrida entre os anos de 1971 e 1973, com a construção do trecho da avenida com o Pátio da Igreja de Nossa Senhora do Carmo e a Praça Sérgio Loreto, em uma área de quase quatro quilômetros quadrados.
À época, a ideia era propiciar uma solução para o movimentado fluxo de veículos na área central da cidade e viabilizar uma ligação direta com bairros da Zona Sul do Recife.
Para a construção da Avenida Dantas Barreto, em 1971, foram demolidos vários edifícios no bairro de Santo Antônio, alguns deles históricos.
No bairro de São José as intervenções atingiram a demolição de seis quadras, centenas de imóveis, várias ruas, o Pátio do Carmo e a Igreja do Bom Jesus dos Martírios.
À época, o prefeito do Recife, Augusto Lucena (1971-1975), que havia iniciado a sua segunda gestão à frente da gestão municipal com a meta de de executar uma modernização dos aspectos urbanos no Centro da cidade, possibilitando o desenvolvimento do Recife como um todo.
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