Mulher acusa Lojas Americanas de racismo depois de ser abordada por funcionários em shopping
"Eu até hoje me sinto injustiçada e envergonhada. Fui vítima de um preconceito", disse Andrea (Rômulo Chico/DP Foto)
Andrea Luciana da Silva, técnica em IPL (Luz Pulsada Intensa) e laser, estava passeando com a família no Shopping Tacaruna, na última quarta-feira (21), quando vivenciou um episódio que considerou racista. Ela fez uma compra na Lojas Americanas e quando voltou até lá para conferir o preço de um dos itens, foi abordada na saída pelo gerente e outros dois funcionários para uma revista. O fato aconteceu na frente do estabelecimento, em uma área comum do centro comercial. Os homens chegaram a sugerir que ela fosse para “uma salinha”, mas Andrea se recusou e disse que só sairia de lá com a polícia.
Era pouco depois das 19h daquele dia quando Andrea e a irmã entraram em dúvida a respeito do preço de um brinquedo que haviam comprado. Elas estavam acompanhadas da mãe, de 78 anos, e de duas crianças, de dois e quatro anos.
“Efetuamos a compra e saímos da loja para andar pelo shopping. Eu estava com o cupom fiscal em mãos quando minha irmã disse que tinha gostado do preço de um brinquedo. Ela achava que tínhamos pago R$ 49, e eu vi na nota que tinha sido R$ 69,99”, relembrou de início, em contato com a reportagem do Diario de Pernambuco.
Para ter certeza do preço, ela resolveu deixar a família em uma das praças de alimentação do Shopping Tacaruna e retornou sozinha para a Lojas Americanas. “Entrei na área de departamento infantil e não vi um brinquedo igual, então peguei na sacola o que eu tinha comprado e usei o leitor. Aí, verifiquei que era mesmo R$ 69,99”, assegurou a mulher de 43 anos.
Quando estava indo reencontrar sua família, no entanto, o passeio começou a se transformar num pesadelo. “Saindo da loja, ouvi o gerente gritar que iam fazer uma revista, só não achei que era em mim. O segurança estava de frente para mim na frente da loja, na área comum do shopping, e então ele e outro funcionário me abordaram e perguntaram o que eu tinha pego e colocado dentro da bolsa. Ele tirou o brinquedo da sacola e perguntou se eu tinha pago”, disse Andrea.
A mulher contou a reação dos três homens quando apresentou o comprovante de pagamento, revelando que eles ainda tentaram a levar para uma sala. Ela se recusou e resolveu acionar a Polícia Militar, que enviou três soldados. Um deles, inclusive, foi quem registrou o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) do episódio, após conduzir os envolvidos até a Central de Plantões da Capital. “Mostrei o cupom fiscal e eles ficaram sem reação. Disseram para a gente ir para uma ‘salinha’, mas eu disse que não ia para ‘salinha’ nenhuma e só sairia de lá com a polícia. Entrei na loja de volta, tirei tudo da sacola e mostrei que paguei por tudo aquilo. O gerente ainda tentou se esquivar”, afirmou a técnica.
Andrea mencionou os olhares que recebeu durante a abordagem. E desabafou sobre a vontade de que o racismo seja interrompido em definitivo da sociedade. “A loja estava lotada, tinha gente olhando no shopping. Eu até hoje me sinto injustiçada e envergonhada. Fui vítima de um preconceito. Um fato que hoje em dia ainda pesa muito é a cor da pele. Eu sinto dor, dói a minha alma. Não consegui nem ir trabalhar no outro dia. Queria que tudo isso parasse de existir, e que cor de pele e cabelo crespo não significassem que estamos no ambiente para fazer algo errado. Precisamos e merecemos respeito”, disse à reportagem, bastante emocionada, antes de se comparar com uma versão diferente do que é.
“Se eu tivesse de outro jeito e fosse branca dos olhos verdes, talvez eu não passasse por aquilo que passei”, completou.
A sua filha Anna Beatriz, de apenas dois anos de idade, também é um dos motivos para que ela se preocupe em combater o racismo. Uma possível repetição do episódio no futuro foi apontada por ela. Dessa vez, com a filha sendo vítima. “A minha filha pode passar por isso amanhã. Um dia desses fui eu e amanhã pode ser com ela. Isso me dói e machuca. Por mais que você esteja no seu direito e correta, é vergonhoso você ser abordada”, desabafou.
Atendimento médico
Segundo Andrea, ela chegou em casa por volta das 2h do dia seguinte, e não conseguiu ir trabalhar.
No período da tarde, sentindo dor e tremor, chegou a tentar atendimento médico numa Unidade de Pronto Atendimento (UPA), mas acabou sendo direcionada para a Prontoclínica Torres Galvão, no Paulista.
“Fui para a UPA, mas lá não tinha clínico geral. Então, fui para a prontoclínica. Eu estava trêmula e com dor de cabeça, porque não dormi. Cheguei em casa umas duas horas da manhã”, contou.
SAC do Shopping Tacaruna
Ainda no dia seguinte, a mulher voltou ao Shopping Tacaruna e procurou o Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) para registrar o que aconteceu e solicitar que as imagens das câmeras de segurança do espaço não fossem apagadas. Nesta terça-feira (27), ela recebeu a confirmação do que havia sido pedido.
“Fui no SAC e solicitei que arquivassem as câmeras, para que não apagassem as imagens. Ontem recebi uma ligação dizendo que as imagens foram salvas”, afirmou.
O que diz o Shopping Tacaruna
A reportagem entrou em contato com o Shopping Tacaruna pedindo sua versão dos fatos, mas ouviu que o centro comercial não irá se pronunciar, alegando que o ocorrido "não tem envolvimento de ninguém do shopping".
O registro feito por Andrea no SAC, de acordo com o Tacaruna, já foi enviado para a loja, como um "procedimento interno". Já em relação as imagens das câmeras de segurança, foram salvas e serão entregues após um pedido judicial.
O que diz a Americanas
A reportagem entrou em contato com as Lojas Americanas, que enviou uma nota. Nela, disse "não tolerar a prática de quaisquer formas de discriminação" e assegurou ter iniciado o processo de apuração junto aos envolvidos. Também citou que seus funcionários passam por treinamentos rotineiros e se colocou à disposição das autoridades que estão à frente do caso.
“A Americanas não tolera a prática de quaisquer formas de discriminação e, neste contexto, acionou seu protocolo de apuração dos fatos para ouvir as versões de todos os envolvidos, e adotar as providências cabíveis. A companhia informa que seus colaboradores passam por treinamentos periódicos acerca de suas políticas e rotinas operacionais, de forma a reforçar as melhores práticas e comportamentos adequados para todos os tipos de situações. A Americanas reitera a existência de um canal exclusivo para o tratamento de atitudes indevidas e informa que está contribuindo com as autoridades para elucidação do caso”, disse a loja.
Por: Ana Beatriz Venceslau
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