A enchente do Capibaribe e a fake news de Tapacurá
Mais da metade da cidade ficou sem energia elétrica, os hospitais funcionavam à luz de velas. O transporte nos bairros era improvisado em botes e barcos, um verdadeiro terror. Quando começou a enchente, o governador José Francisco Moura Cavalcanti deu entrevista no Palácio do Campo das Princesas, alertando para a enchente e pedindo para as pessoas voltassem para suas casas. A água ficou a noite inteira e só começou a baixar no final da tarde do dia seguinte. Outras 25 cidades banhadas pelo Rio Capibaribe foram atingidas, algumas duramente como Camaragibe e São Lourenço da Mata.
Morreram 107 pessoas e 350 mil ficaram desabrigados, muitos perdendo tudo nas suas casas destruídas. Eu morava na Boa Vista, uma das poucas regiões da cidade que não foi atingida e pude ir trabalhar na reportagem do Diario de Pernambuco. Recordo de ter feito a cobertura, usando um caminhão do Exército cedido aos jornalistas. Entre as imagens que me marcaram foi o estádio da Ilha do Retiro, transformado numa enorme piscina.
Outro episódio da cheia de 1975 foi o boato (hoje seria uma fake news) de que a barragem de Tapacurá teria estourado. O pânico generalizado aconteceu no dia 21 de julho, quatro dias após o início da enchente, quando os recifenses tentavam voltar à rotina e contabilizavam prejuízos. Eu testemunhei o drama, em torno das 10h, de um dia de sol. Lembro o cenário: pessoas abandonaram seus carros nas ruas, deixaram seus comércios abertos e corriam sem rumo, alguns tentaram subir nos prédios.
Em geral, a crença é de que uma grande onda viria acabar com a cidade, como um tsunami. Eu tinha saído do Banco do Brasil, no Recife Antigo, onde trabalhava, para ir para a redação do Diario de Pernambuco, na Praça da Independência. O governador Moura Cavalcanti comunicou-se com a administração da barragem de Tapacurá e constatou que a situação era normal. Ele, então, dirigiu-se para o meio da confusão, em frente ao Diretório Central dos Estudantes, na Rua do Hospício. Os estudantes choravam, agitados.
O governador disse que a notícia não era verdadeira, que se Tapacurá houvesse estourado ele não estaria ali naquele momento. Os estudantes se acalmaram e tomaram as ruas gritando para o povo que a notícia sobre o estouro de Tapacurá era falsa, que era boato, que estava tudo bem. O jornalista Homero Fonseca fez uma investigação acerca da origem do boato. A conclusão é teria surgido na Avenida Caxangá, uma das mais atingidas pela cheia.
Alguém soltou o comentário, que foi se espalhando no boca a boca e através das rádios, causando pânico na cidade. Ninguém pensou em conferir se era verdade porque havia um sentimento coletivo de desespero. Hoje, a história parece coisa de folclore. As pessoas que viveram aquele acontecimento, no entanto, quase sempre têm uma história tragicômica para contar.
Da coluna de João Alberto
Nenhum comentário:
Postar um comentário