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quarta-feira, 15 de abril de 2020

VERBA CORTADA

Trump corta repasse à OMS enquanto reafirma poder

Donald Trump, presidente dos Estados UnidosFoto: Win McNamee/Getty Images North America/AFP


Ele criticou a organização por ter 'acreditado nas garantias dadas pela a China' e a culpou por um aumento de 20 vezes do número de casos em todo o mundo

O presidente americano, Donald Trump, disse na terça-feira (14) que ordenou a interrupção, pelo menos temporária, do pagamento das contribuições dos EUA à Organização Mundial da Saúde (OMS) por causa da forma como a entidade tratou a pandemia de coronavírus.

Durante uma entrevista coletiva na Casa Branca, Trump afirmou que a OMS "falhou em seu dever básico e deve ser responsabilizada". Ele criticou a organização por ter "acreditado nas garantias dadas pela a China" e a culpou por um aumento de 20 vezes do número de casos em todo o mundo.

O anúncio foi feito enquanto o americano, em conflito com governadores, especialistas da área de saúde e com suas próprias palavras, briga para tentar impor sua autoridade no comando do país em meio à pandemia. Se faltavam exemplos da crescente necessidade de autoafirmação do líder republicano, a lacuna foi preenchida na entrevista coletiva de segunda-feira (13).

Os briefings diários alimentam o noticiário internacional e, para milhões de americanos, são a principal fonte de informação sobre como os EUA, líderes no ranking de casos confirmados e de mortes causadas pela Covid-19 no mundo, têm encarado a crise.

Ao ser questionado sobre o impasse com os governadores, que se organizam em grupos para planejar a reabertura de seus estados sem considerar a opinião do ocupante da Casa Branca, Trump fez questão de dizer que, "quando alguém é o presidente dos Estados Unidos, a autoridade é total, e os governadores sabem disso". Na prática, no entanto, não parece ser assim.

Minutos depois da resposta, mais uma jornalista voltou ao tema. "Você disse que, quando alguém é presidente dos EUA, a autoridade é total. Isso não é verdade." A Constituição americana dá autonomia aos estados para tomar decisões sobre vários assuntos. No caso das medidas de restrição contra o novo coronavírus, especialistas e consultores concordam que Trump não tem a tal "autoridade total".

"Nenhum estatuto lhe delega esse poder; nenhuma disposição constitucional lhe concede essa autoridade", diz Stephen Vladeck, analista jurídico e professor de direito da Universidade do Texas. A Décima Emenda da Constituição afirma que os poderes não delegados ao governo federal nem proibidos pela Carta aos Estados são de direito dos estados "ou do povo".

Neste contexto, o governador do estado de Nova York, Andrew Cuomo, disse nesta terça (14) que recusaria qualquer ordem de Trump para iniciar o processo de reabertura da economia antes que fosse seguro fazê-lo. O presidente deseja retomar as atividades nos EUA a partir de maio, menos de dois meses após ter colocado o país sob orientações rigorosas de distanciamento social. A previsão tem preocupado especialistas de saúde dentro e fora do governo, que afirmam que a reabertura precoce e sem planejamento pode causar uma segunda onda de transmissões.

Dos estados americanos, Nova York é o mais atingido pelo coronavírus. Na segunda (13), Cuomo afirmou que o estado já teria passado pela fase mais aguda. Como próximo passo, anunciou a formação de uma aliança com outros seis governadores da Costa Leste - Nova Jersey, Connecticut, Pensilvânia, Delaware, Massachusetts e Rhode Island– para estudar como suspender as medidas de distanciamento social gradualmente, elaborar um plano de reabertura de empresas e escolas e definir em que ritmo as pessoas poderão retornar ao trabalho.

Na Costa Oeste, governadores de Califórnia, Oregon e Washington também anunciaram um pacto semelhante. Juntos, os dez estados representam 38% da produção econômica total dos EUA. Dos dez governadores, nove são do Partido Democrata, de oposição a Trump. Apenas o governador de Massachusetts, Charlie Baker, é do Partido Republicano, o mesmo do presidente. Estar ao lado do presidente não significa, entretanto, estar imune às suas críticas e destemperos, como mostra o relacionamento de Trump com seu principal conselheiro para coronavírus, Anthony Fauci.

Diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos Estados Unidos e conselheiro de presidentes americanos desde 1984, Fauci divide com Trump e outras autoridades do governo o tempo de fala durante as entrevistas diárias concedidas na Casa Branca. O epidemiologista se tornou um membro-chave da força-tarefa americana contra o coronavírus, apesar de seus posicionamentos nem sempre se mostrarem compatíveis com os do presidente.

Um episódio ilustrativo dos conflitos entre Trump e Fauci se deu no dia 8. Depois de usar boa parte do tempo da entrevista coletiva para discorrer sobre o uso da hidroxicloroquina como tratamento contra a Covid-19, o presidente cedeu a fala ao especialista. Mas quando Fauci foi perguntado sobre que evidências existem de que o medicamento realmente é eficaz contra o coronavírus, ele foi interrompido pelo próprio presidente. "Você sabe quantas vezes ele já respondeu a essa pergunta? Talvez umas 15."

Embora não tenha respondido aos questionamentos dos jornalistas na ocasião, Fauci já alertou sobre a falta de estudos que comprovem os benefícios da cloroquina, originalmente usada para o tratamento de malária. No domingo (12), outro episódio acirrou ainda mais a tensão entre o presidente e seu conselheiro. Em entrevista à CNN, Fauci falou sobre como as medidas de restrição nos EUA poderiam ter salvado mais vidas se tivessem sido adotadas mais cedo.

Aos apoiadores de Trump a fala do especialista soou como uma crítica ao presidente e fez com que muitos deles divulgassem nas redes sociais a hashtag #FireFauci (#DemitaFauci). O próprio presidente retuitou postagem que continha a hashtag e acusava o especialista de se contradizer. Naturalmente, o conteúdo compartilhado por Trump gerou rumores de que o posto do médico como um dos cabeças na força-tarefa contra o coronavírus logo ficaria vago.

Um dia depois, Fauci justificou que sua declaração foi uma resposta a uma situação hipotética que acabou interpretada como se ele estivesse apontando alguma falha do governo. Disse ainda que, quando falou da "resistência" do governo em relação a algumas recomendações, fez uma má escolha de palavras. Trump deu de ombros, minimizou a importância de sua postagem no Twitter e disse que acha Fauci um "cara maravilhoso", além de afirmar que não vai demiti-lo.

O número de casos confirmados e de mortes provocadas pelo coronavírus nos EUA ainda apresenta tendências de crescimento. De acordo com a universidade Johns Hopkins, até a conclusão desta edição, era, mais de 594 mil casos em todo o país, com um saldo ultrapassa os 25 mil mortos. Enquanto durar a pandemia, a conduta de Trump à frente do país estará ainda mais sob escrutínio.

Como observado em reportagem do New York Times, alguns membros do Partido Republicano já não consideram os democratas, os governadores ou Anthony Fauci os principais adversários de Trump na briga pela reeleição, e, sim, suas próprias palavras.


Folhapress

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