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segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

ELEIÇÕES 2020

Sem Aliança pelo Brasil, Bolsonaro se afasta da eleição de 2020

Jair BolsonaroFoto: Sergio LIMA / AFP



As consequências negativas para uma eventual reeleição em 2022 levaram Bolsonaro a acatar -ao menos oficialmente -a orientação de auxiliares de não subir em palanques de candidatos a prefeitos

A nove meses das eleições municipais e cada vez mais convicto de que a Aliança pelo Brasil não sairá do papel a tempo de entrar na disputa, o presidente Jair Bolsonaro tem indicado uma guinada na estratégia que adotará na corrida deste ano.

As consequências negativas para uma eventual reeleição em 2022 levaram Bolsonaro a acatar -ao menos oficialmente -a orientação de auxiliares de não subir em palanques de candidatos a prefeitos.

"Se meu partido não tiver candidato, não vou me meter em política municipal no corrente ano, ponto final", disse Bolsonaro na quarta-feira (15).


Em conversas reservadas na semana passada, Bolsonaro teria admitido em tom mais enfático que são remotas as chances de conseguir viabilizar a legenda a tempo de participar da disputa deste ano.

Para que a Aliança obtenha seu registro no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e possa entrar na corrida, é preciso reunir 492 mil assinaturas até o início de abril.

Embora os entusiastas da agremiação estejam propagando otimismo em relação à coleta de apoio, pessoas que acompanham de perto o processo de fundação admitem que a Aliança só nascerá em meados de junho ou julho.

Diante desse cenário, aliados de Bolsonaro dizem que o próprio presidente não estaria tão interessado em tirar a agremiação do papel tão rapidamente.

A avaliação que tem sido repetida é a de que, hoje, a presença de Bolsonaro em palanques pelo país traria mais prejuízo do que benefícios ao governo e à imagem do presidente.

De acordo com relatos feitos à reportagem, Bolsonaro tem demonstrado especial incômodo com o quadro eleitoral no Rio de Janeiro.

Embora tenha feito gestos ao deputado federal Otoni de Paula (PSC), o presidente admite dificuldade de não estar no palanque do prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) -sobrinho de Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus.

A saia-justa, dizem pessoas próximas a Bolsonaro, seria a impossibilidade de dizer não ao pastor aliado e, consequentemente, defender uma gestão mal avaliada.

Hoje, o diagnóstico do grupo ligado ao presidente é o de que o desempenho de Crivella na capital fluminense pode beneficiar candidatos de esquerda, como Marcelo Freixo (PSOL).

Ter o carimbo de uma eventual derrota para um dos principais líderes da oposição ao governo não está nos planos de Bolsonaro, dizem aliados do presidente.

A reportagem apurou que tanto Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) como Onyx Lorenzoni (Casa Civil), responsáveis pela interlocução do Executivo com o Legislativo, sugeriram ao presidente que ele se mantenha isento na eleição deste ano.

Além de eventuais derrotas de candidatos alçados pelo bolsonarismo serem consideradas fracasso do presidente como cabo eleitoral, o próprio Bolsonaro já teria ponderado que qualquer deslize na administração de um prefeito apadrinhado por ele pode vir a ser debitada em sua conta na próxima eleição presidencial.

"Às vezes você elege um cara em uma capital aí, se o cara fizer besteira, você vai apanhar na campanha de 2022 todinha", disse Bolsonaro em dezembro, quando recebeu jornalistas no Palácio do Alvorada.

Outro cenário que tem sido avaliado é o de que, ao abraçar o candidato de um partido que não seja da Aliança, Bolsonaro poderia entrar em rota de colisão com as demais siglas daquela disputa -o que prejudicaria ainda mais sua já conturbada relação com o Congresso, onde não tem uma base formal de apoio.

Nessa perspectiva, o caso mais emblemático, segundo dirigentes partidários e líderes políticos ouvidos pela reportagem, também seria o do Rio -berço político do clã Bolsonaro.

O apoio do presidente a outro candidato que não Eduardo Paes (DEM) o colocaria em lado oposto a Rodrigo Maia (DEM-RJ), que comandará a Câmara até janeiro de 2021.

"Duvido que ele vá se indispor com outras legendas em função de qualquer candidatura. Dos 53 deputados do PSL, ele não tem mais metade. Dos 4 senadores, tem o Flávio [Bolsonaro, seu filho], que, com todo desgaste que tem, é mais peso do que plataforma", disse o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP).

O temor no Executivo é que os adversários de candidatos do presidente travem a agenda do governo no Congresso como forma de retaliação, comprometendo as reformas administrativa e tributária.

A melhoria do ambiente econômico em consequência da aprovação desta agenda é tida como essencial para a tentativa de recondução do presidente.

Pessoas próximas a Bolsonaro no Planalto e na Aliança dizem, no entanto, que ele é intempestivo e pode não resistir à tentação de entrar em algumas campanhas.

No ano passado, antes de anunciar a intenção de criar uma nova legenda, Bolsonaro dizia que pretendia atuar como cabo eleitoral na campanha municipal em uma tentativa de manter a polarização que o levou à Presidência.

O objetivo era o de enfraquecer a esquerda e construir uma rede de apoio municipal que lhe desse condições de viabilizar a reeleição.

"Ele vai apoiar candidaturas alinhadas a ele, mas não necessariamente da sigla dele", disse ao jornal Folha de S.Paulo, em julho de 2019, o porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros.

Em São Paulo, por exemplo, o chefe do Executivo já sinalizou apoio a nomes como o do apresentador José Luiz Datena (sem partido).

Segundo um interlocutor do presidente, no entanto, ele não está confiante de que o apresentador da Band sairá mesmo candidato, podendo repetir o recuo de 2018, quando desistiu de última hora da candidatura a senador.

Caso ele não leve a candidatura adiante, Bolsonaro vai trabalhar para Datena se filiar à Aliança e, eventualmente, sair candidato a senador em 2022, em uma chapa que teria o presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Paulo Skaf, como nome ao governo paulista.

Como se cria um partido?O processo de criação de uma legenda envolve várias etapas. São elas:
- Elaboração de um programa e estatuto com assinatura de pelo menos 101 fundadores, que sejam eleitores residentes no Brasil e estejam com direitos políticos plenos;
- Registro em cartório em Brasília e publicação do estatuto no Diário Oficial da União;
- Registro de criação no TSE, em até 100 dias;
- Obtenção do apoio equivalente a 0,5% dos votos válidos da última eleição geral para a Câmara, distribuídos em no mínimo um terço dos estados, com um mínimo de 0,1% do eleitorado em cada um deles; o prazo é de dois anos;
- Obtenção do Registro de Partido Político em pelo menos um terço dos TREs do país e registro da Executiva Nacional no TSE.

Quanto tempo leva todo o processo de criação?Em média, cerca de três anos e meio. O recorde foi do PSD, do ex-ministro Gilberto Kassab, que levou um pouco mais de seis meses.
Para participar de uma eleição, a legenda precisa ser criada até seis meses antes do pleito.

Qual a parte mais demorada?Geralmente é o processo de recolhimento e certificação das assinaturas, que são conferidas pela Justiça Eleitoral (para verificar, por exemplo, se não há duplicações). É comum que os partidos recolham mais assinaturas do que o necessário para compensar as que são desqualificadas.

Quantas assinaturas são necessárias?Levando em conta as eleições de 2018, 0,5% dos votos válidos para a Câmara equivalem a 491.967 assinaturas, que precisam ser distribuídas por ao menos nove estados. Além disso, é necessário que, em cada estado, haja um mínimo de firmas equivalentes a 0,1% dos eleitores que votaram.

Normalmente as legendas costumam apresentar um número próximo de 1 milhão de assinaturas.



Por: Daniel Carvalho, Gustavo Uribe e Thais Arbex (Folhapress)

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