Nove pessoas morrem pisoteadas em baile funk de Paraisópolis
Baile funk em ParaisópolisFoto: Arquivo Pessoal
De acordo com um registro policial, as vítimas foram pisoteadas depois de uma 'ação de controle de distúrbios civis' - ou seja, para dispersão do baile - feita pela Polícia Militar usando 'munições químicas'
Imagens e relatos indicam que a multidão acabou encurralada pela polícia em vielas estreitas –alguns tropeçaram e acabaram mortos. Jovens afirmaram que a ação foi uma emboscada. Vídeos também mostram os policiais chutando um homem caído e batendo nas pessoas com cassetetes.
A Polícia Militar afirma que ainda não é possível saber se a ação ocorreu de maneira correta, que algumas imagens divulgadas sugerem abusos e que tudo será investigado. A corporação sustenta, porém, que a confusão começou após uma perseguição a suspeitos em uma moto, com quem trocaram tiros.
Segundo a polícia, a fuga se deu por 400 metros e depois os suspeitos entraram no meio do baile ainda disparando. "Criminosos utilizaram pessoas no pancadão como escudos humanos", disse o tenente-coronel da PM Emerson Massera.
Os policiais dizem que foram recebidos com pedras e garrafas arremessadas. De acordo com Massera, "houve necessidade do uso de munição química", com quatro granadas de efeito moral e oito tiros de balas de borracha. Jovens feridos e familiares de vítimas negam. Segundo eles, não houve perseguição a suspeitos.
Dono de um bar no fluxo do baile funk, Anderson Figueiredo, 34, diz que os policiais chegaram atirando bombas de gás e balas de borracha. Segundo ele, ambos os lados da rua Ernest Renan foram cercados pelos agentes, que atiravam e batiam em quem se aproximasse. A multidão só conseguiria dispersar por vielas de menos 2 metros de largura, cheias de escadas, o fez com que muitos tropeçassem.
Um vídeo mostra uma multidão cercada e agredida em uma das vielas. "Eu coloquei várias pessoas para dentro do bar, mas não cabia mais gente uma hora", diz Figueiredo.
Massera diz que a perseguição está comprovada, uma vez que policiais avisaram rapidamente sobre o ocorrido. A abordagem à moto aconteceu porque o veículo era parecido com um que já havia atirado nos policiais. A polícia afirma ter encontrado cartuchos que seriam dos criminosos. Os suspeitos e a moto não foram localizados.
O oficial também disse que serão investigados os vídeos com imagens que sugerem abusos e ação desproporcional e que e o consenso é que a atuação deve ser preventiva, isto é, os policiais devem buscar ocupar o lugar do baile funk antes da aglomeração.
Uma adolescente de 17 anos que pediu para não ser identificada conta que ficou presa em uma viela após muita correria e recebeu golpes de cassetete de policiais militares em várias partes do corpo.
"Eles [PMs] foram realmente na maldade para ninguém conseguir correr. Eu ouvi tiros e vi muita gente pisoteada. Eles fecharam as saídas das ruas e saíram espancando. Foi uma covardia."
Rafael dos Santos, 29, vendia cachorro-quente na festa quando foi atingido por uma bala de borracha. "Meu carrinho chegou a cair no chão e as pessoas me ajudaram", disse. "Esse baile ajuda muita gente aqui, movimenta o comércio e paga os aluguéis".
Moradores afirmam que foram jogadas bombas até dentro das casas. Grávida de 18 semanas, J.L., 29, mora em frente ao baile e acordou com a fumaça das bombas dentro de casa. "Meu corredor ficou todo branco. Eu e meus filhos passamos muito mal."
Nas redes sociais, o governador João Doria (PSDB) afirmou lamentar profundamente as mortes e que determinou ao secretário da Segurança Pública, general Campos, apuração rigorosa "para esclarecer quais foram as circunstâncias e responsabilidades deste triste episódio". Três anos atrás, Doria definiu os pancadões como "um cancro que destrói a sociedade".
Neste mês, uma adolescente de 16 anos ficou cega do olho esquerdo após ser atingida por uma bala de borracha durante a dispersão de um baile funk em Guaianases (zona leste da capital paulista).
Há um ano, três pessoas morreram pisoteadas em um baile funk no bairro dos Pimentas em Guarulhos. O caso tem semelhanças com as mortes registradas no domingo.
No caso de Paraisópolis, moradores relatam que a PM passou a agir de maneira truculenta após o sargento Ronaldo Ruas Silva, 52, da Força Tática, ter sido baleado e morrido durante uma ocorrência na comunidade.
Os moradores de Paraisópolis fizeram um protesto com faixas e cartazes na noite de domingo. No asfalto, pintaram a frase "a favela chora".
Folhapress
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