Sem indulto, Planalto e STF comem peru de Natal longe do Brasil real
Milhares de presidiários que teriam direito a indulto neste fim de ano, quase todos pobres e empilhados em condições sub-humanas em presídios do país, devem agradecer à fogueira de vaidades do STF e à pusilanimidade do Planalto a sentença do destino que os manterá presos sabe-se lá por quanto tempo mais. Enquanto isso, o país assiste a mais um capítulo daquela novela cujo enredo se repete sempre sem alterações: em Brasília, o pessoal briga para ver quem é mais esperto, quem joga melhor para a platéia e quem leva mais vantagem; no Brasil real, os perdedores de sempre continuam perdendo.
O decreto do indulto de Natal deste ano não vai sair pela primeira vez em três décadas porque Michel Temer, que também está de saída, não o editou, alegando não saber nem se o de 2017, suspenso por liminar do STF, está em vigor. Um bom pretexto. De quebra, agrada o sucessor, Jair Bolsonaro, que já avisou que nunca mais assinará indultos no país – acabando com uma instituição histórica, presente em diversos países onde vigora o Estado de Direito.
O Supremo, por sua vez, chegou ao Natal de 2018 sem fazer o dever de casa de 2017, em mais um confronto interno que seu presidente, Dias Toffoli, resolveu varrer para debaixo do tapete de 2019 para não expor a Suprema Corte. Evidentemente, um cuidado inútil a esta altura do campeonato.
O indulto foi mais um dos “n” assuntos que dividiram o Supremo e levaram seus integrantes a se engalfinharem publicamente nos últimos tempos. Foi discutido em três sessões do plenário, e há maioria formada de seis votos para respaldar o decreto de 2017 de Temer, que incluiu condenados por corrupção e beneficiaria alguns personagens da Lava Jato – razão pela qual, há quase um ano, teve sua vigência suspensa por Luís Roberto Barroso. Ganhou os aplausos da Lava Jato e adjacências, mas prejudicou muitos presos comuns.
É o que acontecerá novamente agora, quando muita gente que poderia ser solta por se enquadrar em critérios razoáveis para um indulto continuará vendo o sol nascer quadrado. O STF poderia, sim, ter concluído o julgamento interrompido a pedido do ministro Luiz Fux, que pediu vista do processo ao constatar que, junto com Barroso, sairia perdedor. Temer, por sua vez, poderia, sim, ter baixado novo decreto nos mesmos termos do anterior, que claramente teve o respaldo da maioria do tribunal.
Mas ninguém fez nada. Foi todo mundo para casa comer seu peru de Natal longe do Brasil real.
Helena Chagas
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