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quinta-feira, 27 de outubro de 2016

BOCA LIVRE S.A.

PROJETO DE ORQUESTRA VIROU SHOW FECHADO DE ROBERTO CARLOS, DIZ PF
RESPONSÁVEIS PELA OPERAÇÃO BOCA LIVRE S.A. AFIRMAM QUE NÃO HÁ NENHUMA IRREGULARIDADE ENVOLVENDO O CANTOR (FOTO: REPRODUÇÃO)

NOVA ETAPA DA BOCA LIVRE MIRA EM 29 EMPRESAS POR ROUBO À UNIÃO

Ao deflagrar a Operação Boca Livre S.A., que mira em 29 empresas e instituições financeiras por supostas fraudes com recursos captados via Lei Rouanet, a Polícia Federal e a Procuradoria da República em São Paulo descobriram que três projetos, prevendo a captação de um total de R$ 590 mil para apresentações da Orquestra Arte Viva, foram utilizados para bancar um show de Roberto Carlos.
Segundo os investigadores, o espetáculo do Rei ocorreu no aniversário de 108 anos do Esporte Clube Pinheiros, um dos mais tradicionais da capital paulista, em 2007.
Ainda segundo a investigação, o evento foi realizado apenas para associados e convidados do Pinheiros, principal destinatário dos recursos captados.
A procuradora da República em São Paulo, Karen Louise Kahn e a delegada federal Melissa Maximino Pastor, responsáveis pela investigação, afirmaram, porém, que não há nenhuma irregularidade envolvendo Roberto – o cantor não possui nenhum projeto para captar recursos via Lei Rouanet.
“O Clube Pinheiros não aportou recursos, mas ele recebeu a festa de 108 anos de confraternização do clube com patrocínio do Banco Bradesco. Esse patrocínio foi todo decorrente da Lei Rouanet”, informou a delegada Melissa.
A PF e a Procuradoria suspeitam que 29 empresas e instituições financeiras estariam envolvidas no esquema. Todas foram alvo de buscas na Boca Livre S.A., deflagrada nesta quinta-feira, 27.
Boca Livre S.A. cumpriu mandados em dez municípios dos Estados de São Paulo e do Paraná.
“O foco são as grandes empresas que receberam contrapartidas ilícitas, que não tinham previsão legal”, declarou a delegada Melissa. “As contrapartidas obtidas pelas empresas consistiam em shows, festas e eventos privados pagos com dinheiro público da Lei Rouanet.”
Entre 2003 e 2014, as companhias financiaram, por meio do esquema, diversos eventos restritos a convidados, como palestras, shows e festas, com base nos benefícios da Lei Rouanet. Com isso, além de promover suas marcas, elas foram beneficiadas pelos incentivos fiscais previstos na legislação.
A nova operação pode identificar mais fraudes, já que as corporações patrocinaram inúmeros outros projetos.
Parte dos desvios se baseava na apresentação de projetos culturais que, depois de aprovados pelo Ministério da Cultura para a captação de recursos, tinham realização parcial ou sequer eram promovidos. Além do benefício ilícito às companhias, foi constatada a prática de superfaturamento, a apresentação de notas fiscais falsas e o uso de terceiros para a aprovação de projetos, entre outras irregularidades.
A Lei Rouanet foi criada no governo Fernando Collor, em 1991. A legislação permite a captação de recursos para projetos culturais por meio de incentivos fiscais para empresas e pessoas físicas. Na prática, a Lei Rouanet permite que uma empresa privada direcione parte do dinheiro que iria gastar com impostos para financiar propostas aprovadas pelo Ministério da Cultura para receber recursos.
Boca Livre S.A. é desdobramento da Operação Boca Livre, deflagrada em junho passado e que teve como alvo maior o Grupo Bellini e as empresas integrantes do esquema que supostamente praticavam estelionato contra a União, peculato e outros crimes correlatos desde 1998.
A investigação mostra o fluxo do dinheiro que parte de uma conta oficial do Ministério da Cultura quando o projeto cultural é aprovado. “A Bellini Cultural desviava parte dos recursos em benefício próprio, com uma parte executavam parcialmente o projeto e a outra parte volta para algumas das patrocinadoras”, disse Melissa, ao expor a lista das 29 empresas que sofreram buscas.
A relação de pessoas jurídicas foi divulgada com base em autorização da Justiça Federal. “A juíza titular da 3.ª Vara Criminal Federal em São Paulo entendeu que por se tratar de recursos públicos a sociedade brasileira tem o direito de ter o conhecimento para onde o recurso poderia ser aportado, ou seja, qual o projeto, e para onde ele foi desviado e em benefício de quem”, destacou Melissa Pastor.
A delegada e a procuradora Karen chamam a atenção para um episódio que as chocaram. “O projeto foi desenvolvido prioritariamente para crianças em formação de personalidade e o que ocorreu foi um evento gastronômico em um restaurante em São Paulo, para um público fechado da patrocinadora.”
“Há fortes indicativos de que a maior parte dos patrocinadores que hoje estão sendo submetidos a mandados de buscas tinha conhecimento”, anotou a delegada federal. “Encontramos já alguns contratos de patrocínio onde ficava explícita a cláusula de contrapartida, ‘vamos aportar um projeto X e queremos a contrapartida Y’.”
A PF e a Procuradoria destacou que serviços prestados pelo Grupo Bellini ‘nunca existiram’. Foram descobertas notas fiscais inidôneas de serviços fictícios e superfaturamento.
Melissa destacou os ‘projetos duplicados’. “O Grupo teve treze projetos aprovados para um público de caminhoneiro, (projeto) de teatro na beira da estrada, todos similares. Restou demonstrado que muitos desses projetos não foram sequer realizados. Utilizavam a foto de um para comprovar a execução de outro. E desviavam os recursos dos demais. Entre todas essas fraudes tínhamos as contrapartidas ilícitas. O foco dessa nova fase (da Boca Livre) foram as contrapartidas ilícitas.” 


(AE)

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