'Um dos grandes problemas do Náutico é a parte política, e isso atrapalha muito'
Presidente Paulo Wanderley concede entrevista exclusiva ao repórter Daniel Leal e revela bastidores de decisões cruciais para a temporada ruim do clube
Daniel Leal.
O marco da queda do Náutico foi a saída de Gallo. Uma saída sem objeção. Na época, o senhor acreditou que isso seria algo positivo, em termos de visibilidade para o clube?
Recebemos uma ligação do próprio Marín (José Maria Marín, presidente da CBF) solicitando que nós liberássemos Gallo. Não tínhamos como dizer não naquele momento. Mas sabíamos que era algo ruim. Já tínhamos começado o planejamento, vínhamos de uma pré-temporada. Ele conhecia os jogadores, sabia quais atletas iria precisar e nós tínhamos um planejamento. Tanto é que no ano passado, se você se lembrar, só obtivemos êxitos com o planejamento que fizemos com ele desde o fim do Estadual, quando ele assumiu nas semifinais. Sabíamos que iríamos enfrentar dificuldades, mas não imaginávamos que a saída dele seria tão ruim, tão danosa para o clube. A gente imaginava que iria conseguir no mercado um comandante que daria andamento ao planejamento, mas isso não funcionou. Os técnicos que o sucederam não conseguiram implantar a mesma filosofia e cada um quis fazer as mudanças que imaginava, as coisas não deram certo. Foi o começo do insucesso nosso no futebol. O torcedor é pura emoção, entendo a situação do torcedor, também sou torcedor. Eles vivem de resultados, querem ver o time ser campeão, mas tenho a consciência tranquila de trabalhei muito pelo clube e fiz o meu melhor.
Por que contratar Zé Teodoro?
Zé nunca foi um técnico do nosso agrado. Nada contra a pessoa dele. Mas essa foi uma das nossas falhas em ouvir demais. Naquele momento, queríamos outro técnico, que não vem ao caso agora dizer quem era, mas fomos voto vencido. E aceitamos a decisão tomada. Sabíamos que não era o momento para Zé Teodoro, não era o técnico que o Náutico precisava.
Por que contratar tantos jogadores sem um critério definido? Por que trazer atletas como Caion, Adeílson…?
O clube tem uma limitação financeira. Não podemos trazer todos os jogadores no patamar de R$ 80 mil, R$ 100 mil. Tentamos mesclar alguns atletas para ter no banco jogadores mais baratos, mas, infelizmente, olhamos somente o custo-beneficio. Não conseguimos entender que nesse “custo-benefício” é melhor em vez de trazer três (medianos), trazer um só (de alta qualidade). Mas aprendemos com os erros. Podemos até errar, mas não permanecer no erro.
Hoje prestigiadíssimo no Atlético-PR, Vágner Mancini foi demitido no Náutico. Arrepende-se por isso?
Não me arrependo de ter demitido Mancini (que em 14 jogos, teve nove vitórias e cinco derrotas: 64% de aproveitamento), porque a gente não deve se arrepender das coisas que faz, mas sim das que deixa de fazer. Tanto um técnico como um jogador pode ter sucesso em um canto e não ter no outro. Ele estava em uma situação muito desgastada com o elenco, não conseguia fazer o time render e não podíamos trocar todos os jogadores. Imaginamos que trocando o técnico trazendo outro, mudaríamos a situação, o que não aconteceu. Ele também passou por outros clubes que não deu certo. Não atribuo especificamente a isso o nosso insucesso no futebol.
Por que demitir Carlos Kila?
Não acredito que a saída de Kila tenha contribuído para o nosso insucesso. Respeito muito Carlos Kila, mas ele não era responsável pelas contratações, nunca foi. Ele apenas geria a parte administrativa do clube. A gente não pode creditar a ele nem o sucesso nem o insucesso de nada.
O senhor foi a favor da saída de Daniel Freitas?
É um profissional que teve sucesso onde passou. Não gostaria que ele tivesse saído, eu o contratei. A decisão, como sempre, tomamos em conjunto. O colegiado tinha 17 pessoas e foi uma solicitação que atendemos, entendendo que isso poderia ajudar. Mas está aí provado que ele não era e nem foi o único responsável pelo insucesso do Náutico. Todo mundo tem que assumir a sua parcela de culpa. Eu como presidente faço a minha, mas as pessoas precisam assumir também a sua parcela (de culpa).
O que houve entre o senhor e Toninho Monteiro?
Provavelmente, Toninho seria, hoje, o candidato de consenso se ele tivesse se postado como vice-presidente. Ele não se postou. Quis mandar mais que o presidente, quis tomar decisões que não cabiam a ele naquele momento e eu, ponderamente, tentei várias vezes fazer com que ele enxergasse isso. Infelizmente, ele não enxergou. E não cabia a mim deixar levar por essa situação. Naquele momento a gente rompeu e cada um seguiu o seu destino. A sala dele continua lá, e ele nunca foi proibido de entrar no clube nem de entrar na sua sala. Mas eu, como presidente, não poderia admitir que ele como vice quisesse me tirar do cargo completando apenas um ano de mandato. Era isso que ele queria. E pela ansiedade de ele ser presidente, perdeu a oportunidade.
O senhor se sentiu traído pelo colegiado?
Não diria traído. Todos eles, ou grande parte, são amigos. Não imaginava que eles iriam sair naquele momento ruim, com o clube fragilizado. Não vimos razão para a saída do grupo. A versão alegada na época, que seria a contratação de Martelotte, já está provada que não era verídica. Apenas tínhamos feito a consulta com o treinador e iríamos levar para a decisão na mesa. Foi feita a consulta e, quando íamos levar ao colegiado, fomos surpreendidos com essa situação de eles sentirem que passamos por cima deles. Todos sabem que não foi isso. Foi uma desculpa para quem queria sair e lançar uma chapa com os mesmos membros, achando que o torcedor não consegue enxergar. Sempre disse que tenho a minha parcela de culpa, nunca vou negar. Mas essa história que nós todos ganhamos e que só o presidente perde, não vai colar.
Colegiado alvirrubro durante anúncio a contratação do técnico Marcelo Martelotte
O senhor tem algum arrependimento na sua gestão?
Sim, de ter ouvido demais. De ter ouvido tanta gente. Acho que o presidente de um clube como o Náutico tem que ouvir, mas também precisa ser mais duro. Tem que ouvir, mas tem que definir sobre sua consciência. Infelizmente, a gente ouviu demais quando não deveria. Um dos grandes problemas que existe no Náutico é a parte política, e isso atrapalha muito. Como sempre fui um cara muito mediador, sempre pequei muito nisso (em ouvir demais). Temos que ouvir, sim, mas temos que decidir com mais força, mais convicção.
Como é para o senhor ouvir os xingamentos em coro vindos das arquibancadas?
Não é fácil. Sou pai de dois filhos, um com 10 anos e outro com 16 anos. Em um dos eventos o qual eu fui xingado, meu filho se desesperou. Não é fácil ver um filho se desesperar, ver uma esposa em casa achar ruim a situação. Não é fácil. Assim como da mesma forma eu não podia sair na rua para não bater uma foto em 2012. Mas quero dizer que as pessoas sempre têm muito respeito quando me encontram. Dentro do jogo é um momento de maior emoção, onde o torcedor bota para fora a sua revolta. Só quero lembrar, torcedor, que cheguei ao clube em 2002. Sempre estive, nesses 12 anos, todos os dias no Náutico. Sou um dos presidentes mais presentes no clube. Estamos aí, continuamos trabalhando, amamos o clube como qualquer torcedor. É um momento difícil, pois não gostaria nunca de deixar o Náutico nessa situação. Pelo contrário, gostaria de deixar o clube campeão pernambucano, numa boa na Série A… Não seria o caso de passar por tudo isso.
Por que não antecipar as eleições? O senhor não crê que, após o rebaixamento, seria o melhor para o Náutico?
As pessoas estão falando certas coisas que em outras épocas não falaram. Nunca se antecipou eleição alguma no Náutico, então por que antecipar agora? Se é para antecipar, faz uma reunião no conselho do clube, muda o estatuto do clube. Aí, sim, se antecipa. Sou até a favor. Mas eu não posso aceitar o oportunismo das pessoas, de abandonarem o barco numa situação e depois vir com oportunismo. Isso eu não vou aceitar, nunca aceitei e nem iria aceitar agora. Sou um homem que ouço muito mas também tenho as minhas convicções.
Diario de Pernambuco
Nenhum comentário:
Postar um comentário